Intenção de voto, margem de erro e mais: como funciona uma pesquisa eleitoral?

Intenção de voto, margem de erro para mais ou para menos, nível de confiança, pesquisa espontânea e estimulada. Ao longo do período eleitoral, quase todos os dias as pessoas ouvem estas expressões e ficam ligadas no que elas representam. Mas você sabe como funciona uma pesquisa eleitoral? Tem ideia do que caracteriza uma pesquisa eleitoral e no que ela se diferencia, por exemplo, de uma simples enquete?

Imagem de pessoa preenchendo formulário. Como funciona uma pesquisa eleitoral?

Como funciona uma pesquisa eleitoral? Ela deve seguir rigorosos padrões científicos – Foto: Divulgação/TSE/ND

“A enquete não é científica, você não tem a representatividade da população naquele resultado. Por quê? Porque não existe metodologia”, explica o economista Renato Rampinelli, diretor do IPC (Instituto de Pesquisa Catarinense), especialista no assunto e com 24 anos de experiência na área.

“A pesquisa é científica quando você tem os padrões metodológicos que você segue. E quais são esses padrões? Primeiro você precisa calcular a amostra da pesquisa que você quer fazer – e isso envolve estatística.”

Amostra precisa representar a sociedade

De acordo com Rampinelli, para essa amostra ser científica, é preciso garantir que ela tenha representatividade da sociedade a ser retratada.

“Ela tem que representar toda a sociedade: tenho que ter o gênero, a idade, a escolaridade, o peso eleitoral de cada bairro, a formalidade, as pessoas ativas e inativas, quem é dona de casa, quem é empresário, funcionário público. Toda camada da sociedade tem que estar inserida na minha amostra. Então isso é científico”, diz.

Fontes de bases de dados

Para determinar a representatividade dos diferentes estratos sociais, Rampinelli consulta as bases de dados de três fontes: TSE (Tribunal Superior Eleitoral), TRE (Tribunal Regional Eleitoral) e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

“No TSE, a gente tem a informação do perfil socioeconômico. Ali tem o sexo, idade e escolaridade. Dali você faz a representatividade da amostra deste perfil”, afirma.

“Depois usa o TRE do Estado. Ali tem o colégio eleitoral, o número de eleitores por bairro da cidade onde vai fazer. Tem que dar o peso correto também. E o terceiro é o IBGE, que a gente utiliza como fonte de dados da renda familiar. Porque você tem que ter também a representatividade das camadas das classes A, B, C, D e E do município”, continua o economista.

“Tudo isso tem que ser representativo e dar o peso correto. O peso do que existe de homens, de mulheres, do perfil de idade, de renda e assim por diante. Isso é científico. Então eu calculo a amostra, tenho a margem de erro e, dentro dessa amostra, eu faço essa distribuição para ter a sociedade toda representada ali.”, completa Rampinelli.

Modelos de entrevistas variam

Definida a amostra que será pesquisada, é hora de sair a campo para as entrevistas, que podem ser feitas de diversas maneiras: visita residencial, presencial em pontos de fluxo de pessoas, por telefone, por e-mail. Cada instituto tem seu método preferido e todos são válidos, desde que produzidos com o rigor científico que a pesquisa exige.

Rua movimentada no centro de Florianópolis, onde se faz pesquisa eleitoral

Entrevistas em ponto de fluxo intenso de pessoas é um método de coleta de pesquisa de opinião – Foto: Arquivo/ND

O que é e como funciona uma pesquisa eleitoral?

“Existem vários institutos que fazem de diversas formas: por telefone, por e-mail, em ponto de fluxo. O IPC aplica um pouco diferente: a gente faz residencial”, conta Rampinelli.

Ele justifica que no ponto de fluxo – aqueles locais por onde passam muitas pessoas – um cabo eleitoral, por exemplo, pode perceber que está acontecendo uma pesquisa e mandar pessoas ficarem circulando para tentar participar, o que pode distorcer os resultados.

Ele também prefere não fazer em locais de aglomeração de pessoas, para evitar que o entrevistado seja influenciado por alguém que está a seu lado.

Rampinelli garante não questionar os métodos dos outros institutos nem mesmo dizer que está errado quem faz de outra forma, mas que acredita que a precisão maior é no método que o IPC utiliza.

“Na nossa avaliação, a precisão maior é na forma de entrevistar as pessoas em casa. Ali você vai pegar a opinião de um morador, não de mais de um. Aí você tem a certeza de que essa pessoa mora ali e ela vota ali. No fluxo, ela pode mentir e eu não sei se ela mora no bairro onde ela falou e se ela é moradora ou eleitora lá”, explica.

“A gente preza muito pela coleta da informação, porque não adianta fazer um relatório bem feito, com gráfico bonito, com tendência, se minha coleta foi equivocada. A gente costuma fazer dessa forma e até hoje a gente sempre obteve um índice de acerto de mais de 95% dos trabalhos que fez ao longo das eleições nestes mais de 20 anos.”

Pesquisa espontânea x Pesquisa estimulada

Entre os métodos tradicionais de pesquisa eleitoral estão a espontânea e a estimulada. Na espontânea, o entrevistador pergunta em quem o entrevistado votaria se a eleição fosse naquele dia, mas não apresenta opções de nomes. Na estimulada, é feita a mesma pergunta, mas o pesquisador mostra um cartão circular com os nomes de todos os candidatos. O formato é feito para que não fique um nome em cima e outro embaixo.

“Quanto mais longe da eleição, o indeciso tende a ser maior na espontânea. Quanto mais perto da eleição, a tendência da espontânea é ir se aproximando da intenção da estimulada”, revela Rampinelli.

Ele destaca que a pesquisa espontânea mostra a fidelização do voto do candidato.

“Digamos que tenho 15 pontos na espontânea e 35 na estimulada. Eu sei que tenho 15 fidelizados, os outros ainda não são. Vai chegando a eleição, eu vou permanecer no 35, por exemplo, na estimulada, e o meu espontâneo vai pra 20, 22, 25. O objetivo da espontânea é medir justamente isso: a eleição na sociedade, quando começa a baixar indeciso é que a campanha está na base, e mede a fidelização do voto.”

Fórmula matemática define margem de erro

A tão falada margem de erro é calculada usando uma fórmula matemática. Numa pesquisa eleitoral municipal, por exemplo, ela vai depender do número de eleitores da cidade e da amostra que o instituto vai entrevistar.

“Essa fórmula matemática vai te dar a margem de erro”, explica Rampinelli.

Nível de confiança da pesquisa eleitoral

Segundo o especialista, o percentual, por exemplo, de 95% de nível de confiança não tem relação com a margem de erro.

“Um nível de confiança de 95% significa que a cada 100 entrevistas que eu faço, 95 estão dentro da margem de erro”, esclarece.

Sem descarte de dados

Rampinelli também salienta que o número de entrevistados corresponde exatamente à amostra definida para a pesquisa.

“Se a amostragem é 600, ouve 600. Não faz mais. Dentro do critério que tem que ser feito.”

Antes do início das entrevistas, cada pesquisador já sabe com quantas pessoas terá que falar.

“Vai num bairro que tem X entrevistas para fazer. Cada um vai fazer um número. Você vai fazer quatro desse perfil, você vai fazer cinco desse perfil, seis daquele. Pelo menos a gente faz assim. Eu desconheço instituto que faz mais, se deleta, se joga fora, não sei.”

Ele conta que o pesquisador bate em determinada casa. Se a pessoa que daria entrevista está fora do perfil determinado, ele agradece e vai embora.

“Não tem descarte de dados, a não ser que a gente veja que tem alguma coisa que foi feita equivocada, aí a gente manda fazer de novo”, garante.

Dupla fiscalização

No caso do IPC, um coordenador percorre o local das entrevistas junto com os pesquisadores e já aproveita para fiscalizar o trabalho.

“O trabalho é fiscalizado no campo e depois os dados são transferidos para o escritório, onde a gente analisa o comportamento de cada tablet.”

Imagem de eleitor na urna eletrônica

Em condições normais, resultado das urnas reflete o que a pesquisa apontou Foto: Roberto Jayme/Divulgação/ND

Pesquisa eleitoral é retrato de momento

Renato Rampinelli reforça a noção de que pesquisa eleitoral reflete aquele momento.

“Pesquisa eleitoral é fotografia de momento, não é antecipação de resultado de eleição. Naquele momento é isso. Daqui três dias pode mudar”, destaca o diretor do IPC.

Segundo ele, alguns fatores explicam, por exemplo, quando ocorre uma diferença muito grande entre o que a pesquisa eleitoral apontava e o resultado da eleição.

“Pode ser culpa do instituto, mas podem acontecer adversidades que o instituto não consegue captar. Não o instituto, ninguém consegue, porque ninguém tem bola de cristal”, diz Rampinelli.

Fatos ocorridos após o fechamento da pesquisa afetam o resultado, mas, obviamente, não têm como ser captados. Para demonstrar, usa um exemplo extremo.

“Eu faço uma pesquisa em Florianópolis segunda, terça e quarta, a eleição é no domingo. Dá um resultado. Na sexta-feira o candidato sai pelado na rua e bate na mulher. Vai mudar”, afirma.

“Se mantém tudo constante, na normalidade, eu fiz pesquisa segunda, terça e quarta, no domingo a urna vai comprovar aquilo que a pesquisa está indicando. Mas se acontecer adversidade essa que eu citei, ou uma onda, não tem como mensurar isso”, finaliza.

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